Óleo de peixe: terapia adjuvante em pacientes com Covid-19?
Como se sabe, mais do que uma síndrome respiratória, a Covid-19 é uma doença capaz de afetar o organismo de múltiplas formas em razão da chamada “tempestade de citocina” no corpo, que provoca um grave quadro inflamatório. Sendo assim, a administração parenteral com ácidos graxos poli-insaturados, como o ômega 3, vem sendo fortemente discutida como terapia adjuvante em pacientes hospitalizados com Covid-191, visto que já há consenso sobre os benefícios do manejo de óleo de peixe em pacientes críticos, com redução do tempo de UTI, resolução de processos inflamatórios e menores taxas de infecções sistêmicas
Por que a suplementação com óleo de peixe poderia ser benéfica a pacientes com Covid-19?
Conforme já mencionado, a Covid-19 é uma doença que não atinge de forma grave necessariamente os pacientes que já tinham histórico de problemas respiratórios. Critérios como idade avançada, obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão e síndrome metabólica são agravantes que favorecem a hiperinflamação1.
A resposta inflamatória é consequência da produção exacerbada de citocinas. A resolução do quadro, contudo, depende da ação de grupos lipídicos de moléculas chamados de mediadores pró-resolutivos especializados (SPMs).
Os SPMs, reconhecidos por seu potencial anti-inflamatório, inclusive pela revista Nature, caracterizam-se por serem lipídios, e não proteínas, e têm a função de acelerar o processo de limpeza e regeneração de tecidos, permitindo o retorno da homeostase2. Sua sintetização, todavia, depende de ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa (PUFAS), como o ácido eicosapentanóico (EPA) e ácido docosahexaenóico (DHA), ambos da família do ômega 3, substância em que o óleo de peixe é bastante rico.
Torrinhas et al. mencionam que os SPMs participam do “sequestro” de citocinas pró-inflamatórias e da remoção de microrganismos invasivos, proporcionando a restauração da estrutura e a homeostase do tecido.
Os autores apontam, ainda, que EPA e DHA podem inibir a síntese de citocinas pró-inflamatórias, modulando a ativação de fatores de transcrição gênica e desestabilizando a domínios lipídicos da membrana (os “rafts” de membrana). Vale lembrar, nesse caso, que a enzima conversora de angiotensina 2, um receptor usado por SARS-CoV-2 para entrar nas células humanas, está localizada nesses domínios lipídicos da membrana3.
Estresse oxidativo
Evitar o estresse oxidativo seria outro benefício da suplementação enteral do óleo de peixe em pacientes com Covid-19. Isso porque o estresse oxidativo via infecções por vírus RNA pode contribuir para eventos com apoptose (morte celular programada), perda da função imunológica e replicação viral. Em contrapartida, a administração de óleo de peixe junto a antioxidantes, como vitamina C e E, levaram a resultados como redução de mortalidade, menor risco de falência orgânica, menor tempo de ventilação mecânica, além de redução de tempo de internação em UTI.4,5,6,7.
Veja abaixo o esquema que demonstra, mais detalhadamente, os benefícios e efeitos adversos da suplementação com óleo de peixe.
Óleo de peixe em quadros cardiovasculares e trombóticos de pacientes com Covid-19
Outra importante atuação do óleo de peixe seria na geração (via EPA) de eicosanóides que são funcionalmente menos intensos e, ainda, antitrombóticos1. Evidências sugerem que uma maior ingestão de n-3 PUFAs teria efeitos benéficos sobre os perfis lipídicos, substituindo ácidos graxos saturados e reduzindo níveis de triglicerídeos, estabilizando assim as placas ateroscleróticas e reduzindo a incidência de formação de trombos8,9,10.
Há também a hipótese de que os efeitos cardioprotetores de ácidos graxos ricos em ômega 3 sejam atribuídos às suas propriedades imunomoduladoras. Especialmente, evidências crescentes demonstram a capacidade de n-3 PUFAs em reduzir os níveis circulantes de quimiocinas inflamatórias, citocinas e os metabólitos pró-inflamatórios derivados de n-6 PUFAs11.
