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As principais indicações de nutrição parenteral periférica para o paciente cirúrgico

Pacientes submetidos a uma cirurgia gastrointestinal de grande porte podem necessitar terapia nutricional devido ao risco de desnutrição relacionada a doenças pré-existentes e ao impacto do procedimento no estado nutricional do doente cirúrgico. Nesse contexto, a nutrição parenteral periférica pode atuar como uma intervenção minimamente invasiva sempre que possível1.

No entanto, isso não elimina algumas incertezas em relação ao emprego desse recurso. Consultar diretrizes clínicas em relação ao assunto pode ser uma atitude importante para o profissional que cuida de um paciente cirúrgico1.

O conhecimento pode ampliar abordagens que promovam cuidados menos invasivos capazes de minimizar o estresse da cirurgia e garantir a recuperação mais rápida do paciente2 (o que é conhecido como Eras, do inglês Enhanced Recovery After Surgery).

 

O uso de nutrição parenteral em pacientes cirúrgicos

 

Conforme apontam as diretrizes da Espen, a nutrição parenteral no perioperatório tem como objetivo contornar a desnutrição e as consequências do estado catabólico desencadeado pelas cirurgias3.  Dessa forma, espera-se manter ou melhorar a condição nutricional desse paciente e prevenir a desnutrição.

Como de praxe, a nutrição parenteral perioperatória consiste no fornecimento de quantidades adequadas de aminoácidos, glicose, lipídios e micronutrientes para pacientes que são incapazes de receber nutrição via oral/enteral ou para os quais essas vias não são suficientes para ofertar toda necessidade nutricional para a condição clínica do momento4. Existem algumas características das fórmulas e da via de administração que precisam ser diferenciadas.

A nutrição parenteral total (NPT) é administrada por meio de cateter central aos pacientes com demandas nutricionais que não podem ser atendidas pela via oral ou enteral5,6. Já a nutrição parenteral periférica se dá através de um cateter venoso periférico com solução de baixa osmolaridade (geralmente 850 e 900 mOsm/L)5,6.

Geralmente, pacientes podem receber a nutrição parenteral periférica por até 14 dias, em média3,6-8. Além disso, ela pode funcionar como uma transição para a nutrição enteral ou oral ou ainda como fonte calórica e proteica imediata quando o acesso venoso central não estiver disponível,6-8.

 

Os desafios para a introdução adequada da nutrição parenteral

 

A ampla variedade de condições, fórmulas e identificação do melhor momento para uso podem gerar dúvidas na indicação da terapia de nutrição parenteral, tão necessária em circunstâncias cirúrgicas. Os médicos responsáveis pelo acompanhamento muitas vezes não têm experiência nesta área, por exemplo9-11. No mais, a identificação dos pacientes cirúrgicos que terão algum benefício com a indicação desse suporte nutricional costuma ficar aquém do ideal12,13.

Diante disso, um painel de especialistas se uniu para analisar a literatura sobre o tema e reduzir as lacunas do conhecimento a respeito do uso da nutrição parenteral periférica em cirurgias gastrointestinais1.

Posteriormente, eles registram, em artigo publicado em 2021, informações sobre de que maneira a terapia nutricional poderia ser usada para acelerar a recuperação desses pacientes tendo como ponto de partida os protocolos Eras. Os autores reconhecem que devemos tratar os pacientes com indicação correta no momento adequado para isso1.

 

Confira também: O que mudou com o passar dos anos nas diretrizes da ESPEN para pacientes cirúrgicos?

 

Quando a nutrição parenteral periférica costuma ser recomendada

 

De maneira geral, pacientes que necessitam de cirurgia gastrointestinal de grande porte e que estão incapazes de receber nutrição suficiente por via oral e/ou enteral durante o período perioperatório são candidatos à nutrição parenteral periférica1.

Ela deve ter como objetivo complementar a nutrição (do ponto de vista energético e nutricional) e limitar a resposta ao estresse que o procedimento cirúrgico proporciona1.

Tal recomendação foi praticada em um estudo com 53 pacientes com deficiências nutricionais moderadas ou graves que receberam a nutrição parenteral periférica antes (15%) ou depois (40% dos casos) de um procedimento cirúrgico para remoção de um tumor gastrointestinal ou por fístulas no intestino delgado8.

Com o devido aporte de nutrição parenteral periférica, foi possível alcançar as necessidades nutricionais em mais de 2/3 dos pacientes (68%) dentro de 3 dias8.

 

Aspectos fundamentais para uma prescrição apropriada

A partir disso, os especialistas que assinam o artigo reforçam que a nutrição parenteral periférica é recomendada sobretudo quando1:

  • Outras formas de suporte nutricional não atendem às demandas do paciente;
  • O paciente está em risco nutricional ou desnutrido;
  • Há uma necessidade de curto prazo para um aporte nutricional via nutrição parenteral;
  • O paciente é incapaz de se alimentar por mais de 5 dias (incluindo pré e pós-operatório) ou não será capaz de manter mais da metade do seu consumo calórico e proteico ideal por mais de 7 dias;
  • Existe uma previsão de um jejum pós-operatório prolongado que pode impactar negativamente na condição nutricional do doente;
  • O acesso venoso central não está disponível ou apresenta limitações por complicações relacionadas ao cateter central, como infecções ou tromboses.

Em geral, bolsas all-in-one devem ser a escolha de preferência na administração da nutrição parenteral periférica1. Seu conteúdo deve ser compatível com as necessidades nutricionais do paciente, levando em conta a energia e os nutrientes obtidos também por outras vias1.

Além disso, é importante que seja considerada a condição de doença do paciente, seu risco nutricional, o impacto do procedimento cirúrgico e riscos de comorbidades como colestase e prejuízo da função renal e/ou hepática em função da composição da fórmula1.

 

De que forma esse recurso pode favorecer a recuperação dos pacientes

Entre alguns dos motivos que fazem da introdução da nutrição parenteral periférica uma abordagem vantajosa estão1:

  • Eliminação dos riscos associados ao uso de cateteres venosos centrais, o que está em linha com uma abordagem menos invasiva privilegiada pelos protocolos Eras;
  • Complementação da nutrição em períodos de transição para outras formas de administração de nutrientes;
  • Melhor tolerância dos pacientes à terapia nutricional, sobretudo em comparação ao uso de sonda para nutrição enteral.

Embora limitados, os estudos sobre o uso da via periférica demonstram que ela pode contribuir para redução da perda de peso e de complicações pós-operatórias, além de melhorar os indicadores de qualidade de vida e reduzir a duração de internação hospitalar1.

Normalmente, a nutrição parenteral periférica é bem tolerada. Complicações como a tromboflebite podem ser prevenidas com devidos cuidados na manipulação dos cateteres e a escolha da fórmula adequada para terapia nutricional1.

Apesar disso, um questionário respondido por 130 cirurgiões gastrointestinais mostrou que, embora haja conhecimento sobre os benefícios da nutrição parenteral periférica, esse é um recurso subutilizado14.

Logo, pode ser necessário ampliar a divulgação do conhecimento a respeito dos benefícios da terapia quando indicada para o paciente correto, no momento adequado. O uso de ferramentas de triagem nutricional e de protocolos que favoreçam a adoção de recursos menos invasivos, sempre que possível, contribuirão para resultados de sucesso da terapia parenteral periférica14.

Para saber mais sobre o uso da nutrição parenteral em diferentes circunstâncias, continue acompanhando o Unidos da Nutrição Clínica, uma iniciativa Fresenius Kabi.

 

Referências:

  1. Senkal M, Bonavina L, Reith B, Caruso R, Matern U, Duran M. Perioperative peripheral parenteral nutrition to support major gastrointestinal surgery: expert opinion on treating the right patients at the right time. Clin Nutr ESPEN. 2021;43:16-24. Disponível em: <https://clinicalnutritionespen.com/article/S2405-4577(21)00148-0/fulltext> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  2. Altman AD, Helpman L, McGee J, Samouëlian V, Auclair MH, Brar H, et al. Enhanced recovery after surgery: implementing a new standard of surgical care. 2019;191(17). Disponível em : <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6488471/> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  3. Weimann A, Braga M, Carli F, Higashiguchi T, Hubner M, Klek S, et al. ESPEN guideline: clinical nutrition in surgery. Clin Nutr. 2017;36(3):623-50. Disponível em: <https://www.clinicalnutritionjournal.com/article/S0261-5614(17)30063-8/fulltext> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  4. Braga M, Ljungqvist O, Soeters P, Fearon K, Weimann A, Bozzetti F, et al. ESPEN guidelines on parenteral nutrition: Surgery. Clin Nutr. 2009;28(4):378-86. Disponível em: <https://www.clinicalnutritionjournal.com/article/S0261-5614(09)00081-8/fulltext> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  5. Pittiruti M, Hamilton H, Biffi R, Macfie J, Pertkiewicz M. ESPEN guidelines on parenteral nutrition: central venous catheters (access, care, diagnosis and therapy of complications). Clin Nutr. 2009;28(4):365-77. Disponível em: <https://www.clinicalnutritionjournal.com/article/S0261-5614(09)00078-8/fulltext> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  6. Worthington P, Balint J, Bechtold M, Bingham A, Chan L-N, Durfee S, et al. When is parenteral nutrition appropriate? JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2017;41(3):324-77. Disponível em: <https://aspenjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1177/0148607117695251> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  7. Culebras JM, Martin-Pena G, Garcia-de-Lorenzo A, Zarazaga A, Rodriguez-Montes JA. Practical aspects of peripheral parenteral nutrition. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2004;7(3):303-7. Disponível em: <https://journals.lww.com/co-clinicalnutrition/abstract/2004/05000/practical_aspects_of_peripheral_parenteral.10.aspx> Acesso em 13 de agosto de 2024.
  8. Correia MI, Guimaraes J, de Mattos LC, Gurgel KC, Cabral EB. Peripheral parenteral nutrition: an option for patients with an indication for short-term parenteral nutrition. Nutr Hosp. 2004;19(1):14-8. Disponível em: <https://scielo.isciii.es/pdf/nh/v19n1/original2.pdf> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  9. Daley BJ, Cherry-Bukowiec J, Van Way 3rd CW, Collier B, Gramlich L, McMahon MM, et al. Current status of nutrition training in graduate medical education from a survey of residency program directors: a formal nutrition education course is necessary. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2016;40(1):95-9. Disponível em: <https://aspenjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1177/0148607115571155> Acesso em 13 de agosto de 2024.
  10. Paulo DA, de Oliveira BM, Wang DW, Guimaraes MP, Cukier C, Lopes Filho Gde J. Surgeons’ knowledge and attitude regarding concepts of nutritional therapy. Rev Col Bras Cir. 2013;40(5):409-19. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rcbc/a/LHCd8FcKQY88xcDXzr4Brdp/?lang=en> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  11. Kirbiyik F, Ozkan E. Knowledge and practices of medical oncologists concerning nutrition therapy: a survey study. Clin Nutr ESPEN. 2018;27:32-7. Disponível em: <https://clinicalnutritionespen.com/article/S2405-4577(18)30331-0/fulltext> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  12. Williams JD, Wischmeyer PE. Assessment of perioperative nutrition practices and attitudes-A national survey of colorectal and GI surgical oncology programs. Am J Surg. 2017;213(6):1010-8. Disponível em: <https://www.americanjournalofsurgery.com/article/S0002-9610(16)30867-4/abstract> Acesso em 13 de agosto de 2024.
  13. Spiro A, Baldwin C, Patterson A, Thomas J, Andreyev HJ. The views and practice of oncologists towards nutritional support in patients receiving chemotherapy. Br J Cancer. 2006;95(4):431-4. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2360668/> Acesso em 03 de setembro de 2024.
  14. Durán-Poveda M, Bonavina L, Reith B, Caruso R, Klek S, Senkal M. Nutrition practices with a focus on parenteral nutrition in the context of enhanced recovery programs: An exploratory survey of gastrointestinal surgeons. Clin Nutr ESPEN. 2022;50:138-47. Disponível em: <https://clinicalnutritionespen.com/article/S2405-4577(22)00300-X/fulltext> Acesso em 03 de setembro de 2024.

 

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