Como é Aplicada a Nutrição Parenteral?
A nutrição parenteral é um tratamento complexo e sujeito a diversos riscos, desde a sua indicação até a sua administração (1). Dessa forma, é essencial que os profissionais de saúde mantenham um aprendizado contínuo, aprimorando a técnica e garantindo a segurança no processo.
Neste artigo, abordaremos como deve ser feita a infusão da nutrição parenteral, destacando as melhores práticas, e as diferenças entre os sistemas.
Sistema de frascos múltiplos vs sistema 3 em 1
A depender das necessidades do paciente, da estabilidade dos componentes e das condições de armazenamento, a nutrição parenteral pode ser preparada e administrada de duas formas principais: em sistema de frascos múltiplos ou sistema 3 em 1.
Sistema de frascos múltiplos
No sistema de frascos múltiplos, os componentes da nutrição parenteral (aminoácidos, glicose e emulsão lipídica) são administrados a partir de frascos separados pela junção de conectores múltiplos que alimentam um cateter intravenoso comum. Vitaminas e oligoelementos normalmente são adicionados à NP a partir de preparados concentrados (2, 3, 4).

O sistema de frascos múltiplos conta com as seguintes desvantagens (2, 3, 4):
- Necessidade de um conector e múltiplos conjuntos de administração
- Exige frequentes substituições de frascos
- Necessidade de ajustar taxas de fluxos diferentes e irregulares, além de fazer muitas adições
- Probabilidade maior de erros de administração
- Exige muito tempo
- Exige verificação frequente de glicemia e eletrólitos plasmáticos
No entanto, se forem manuseados corretamente, os sistemas de frasco único contam com certas vantagens. Por exemplo, oferecem uma maior flexibilidade no que diz respeito à dosagem e na elaboração de NP altamente específica, ajustando-se a várias necessidades do paciente (2, 3, 4).
Sistema 3 em 1
No sistema 3 em 1 (também conhecido como “all-in-one”, AiO), há uma mistura total de nutrientes na mesma bolsa (5). Ao combinar a emulsão lipídica com os demais componentes da NP, o crescimento microbiano é inibido, permitindo que a terapia seja infundida por 24 horas (6).
Suas principais vantagens incluem (4, 6):
- Economia de custos durante a preparação, manuseio e entrega
- Melhor utilização e assimilação de nutrientes
- Facilidade de armazenamento e administração
- Taxa reduzida de complicações metabólicas (por exemplo, hiperglicemia e distúrbios eletrolíticos), diminuindo ainda mais o custo do monitoramento
- Redução do risco de contaminação por toque durante a administração
- Crescimento bacteriano retardado
- Diminuição do tempo de enfermagem
- Simplificação do processo ao remover a necessidade de duas infusões separadas, reduzindo erros de medicação
Além disso:
– Substituir parte da glicose por gordura reduz o risco de efeitos adversos associados à ingestão excessiva de glicose;
– A adição de emulsão de gordura reduz a irritação venosa ao diminuir a osmolaridade da fórmula nutricional, permitindo a administração por veias periféricas;
– Devido a menos conexões, menor manuseio de trocas de frascos e outras manipulações, a taxa de sepse diminui.
Das poucas desvantagens deste sistema, inclui-se a impossibilidade de remover uma substância de uma bolsa já preparada (por exemplo, potássio, quando há um aumento inesperado no potássio sérico após a bolsa ter sido preparada e a infusão iniciada) (4).
Além disso, a inspeção visual de precipitados ou material particulado na mistura fica prejudicada (6).
Os sistemas AiO são disponíveis em três formas:
- Bolsas com múltiplos compartimentos (2, 3, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19):
Disponíveis em versões de dois ou três compartimentos, essas bolsas mantêm os macronutrientes separados até o momento da administração. São seguras, práticas e estáveis, com menor risco de contaminação e menor custo em comparação com as NP manipuladas.
- Bolsas de dois compartimentos: contêm glicose e aminoácidos separados, com a emulsão lipídica adicionada pouco antes da infusão.

- Bolsas de três compartimentos: incluem glicose, aminoácidos e lipídios em compartimentos distintos, permitindo uma administração mais completa e conveniente.

- NP manipulada (2, 3, 7, 8, 9, 10):
Misturas personalizadas preparadas manualmente, geralmente em farmácias hospitalares, para atender às necessidades específicas dos pacientes.
São indicadas para pacientes com requisitos metabólicos variáveis, mas apresentam alto custo, maior risco de erro na prescrição e maior risco de infecção quando comparadas às bolsas multicâmaras.
- Manipulação automatizada (11, 12):
Utiliza dispositivos automatizados para preparar a nutrição parenteral, reduzindo o risco de erro humano e melhorando a precisão da formulação. É mais eficiente que a manipulação manual, pois economiza tempo e otimiza o uso de recursos hospitalares.
Sistema gravitacional vs. bomba de infusão
A NP pode ser administrada usando uma bomba para alimentação intravenosa ou por gravidade. Os critérios para a escolha do meio de administração apropriado incluem:
- Velocidade da infusão
- Duração da infusão
- Precisão exigida
- Objetivos terapêuticos
A infusão gravitacional depende da pressão hidrostática sem o auxílio de uma bomba de infusão. A velocidade da infusão é regulada por um controlador de fluxo passivo e calculada com base no gotejamento. O controlador de fluxo pode ser uma pinça rolete interagindo diretamente com a sonda ou um controlador específico de fluxo. Este fornece maior precisão e estabilidade do fluxo.
A infusão por gravidade é recomendada se não houver uma necessidade muito grande de velocidade e precisão de infusão.
A infusão auxiliada por bomba é realizada por meio de uma bomba volumétrica trabalhando com conjunto com sistemas de infusão ou por meio de seringas controlando o fluxo com um pistão movido a motor. Essa abordagem é apropriada para infusões de baixo volume. A infusão auxiliada por bomba garante a alta precisão com velocidade constante de infusão e permite o ajuste do ciclo.
Administração contínua vs cíclica
Finalmente, a nutrição parenteral pode ser administrada de duas formas principais: contínua ou cíclica. A escolha entre esses métodos depende das condições clínicas do paciente, tolerância metabólica e objetivos terapêuticos.
Na NP contínua, a infusão da nutrição parenteral ocorre de maneira ininterrupta ao longo de 24 horas. Pacientes que necessitam de NP de curto prazo, que representam a maioria dos pacientes hospitalizados com NP, geralmente recebem NP contínua (20).
Essa forma de administração permite menos manipulação e uma menor taxa de infusão, limitando a sobrecarga de glicose e fluidos (20).
Por outro lado, a NP cíclica consiste na administração intermitente de soluções intravenosas, com períodos regulares de pausa na infusão. Normalmente, é administrada em infusões únicas de 10 a 14 horas, podendo variar entre 8 e 23 horas (21).
A administração cíclica durante uma parte do dia ou da noite permite que o paciente fique livre do tubo intravenoso e do aparelho de bomba. Ela é frequentemente administrada para pacientes em nutrição parenteral domiciliar, bem como uma estratégia contra o comprometimento hepático associado à NP (20).
Quando a administração cíclica é proposta, a glicemia deve ser monitorada para evitar hipoglicemia após a descontinuação, assim como hiperglicemia devido ao aumento da taxa de infusão (20).
Conclusão
A infusão de nutrição parenteral é um processo complexo, que exige precisão e cuidado. Os sistemas de frascos múltiplos e tudo em um (AiO) apresentam diferentes vantagens e desvantagens, que devem ser consideradas de acordo com as necessidades do paciente. A escolha entre infusão por gravidade ou bomba também depende de fatores clínicos específicos.
Independentemente do método, é fundamental que os profissionais de saúde sigam boas práticas para garantir a segurança e eficácia do tratamento.
Referências:
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