Saiba mais sobre a composição das emulsões lipídicas na nutrição parenteral.
O conhecimento sobre os benefícios das emulsões lipídicas na nutrição parenteral vem evoluindo continuamente desde os anos 19601. Com isso, em paralelo, foram sendo construídas evidências sobre como cada molécula de lipídio contribui na oferta calórica total, nas vias metabólicas de produção de energia, bem como para a sua devida utilização e armazenamento no organismo humano1.
Dessa forma, profissionais de saúde que trabalham com suporte nutricional devem estar cientes da composição das emulsões lipídicas e das propriedades metabólicas, biológicas e de outros aspectos relativos ao uso de cada opção disponível no mercado.
Quais as características de cada geração de emulsão lipídica?
A primeira emulsão lipídica comercialmente disponível, que data de 1961, era composta exclusivamente de óleo de soja. Na média, essa fórmula contribui com aproximadamente 50% de ácido linoleico no perfil total dos ácidos graxos2,3. Porém, tal composição desencadeava um maior estresse oxidativo, o que gerou a necessidade de repensar a composição das emulsões lipídicas existentes3.
Assim, os produtos com óleo de soja são considerados a primeira geração dessas fórmulas. Seja como for, eles têm uma composição capaz de prevenir a deficiência de ácidos graxos essenciais e manejar o aporte de glicose para prevenir a hiperglicemia4.5.
A segunda geração de emulsões lipídicas (disponível desde 1985) reúne triglicerídeos de cadeia média e cadeia longa (chamados TCM e TCL, respectivamente) 1 por meio de diferentes combinações de óleo de soja e de óleo de coco.
A partir dos anos 1990, as emulsões da terceira geração foram feitas majoritariamente a partir de óleo de oliva e buscavam reduzir o aporte de ácidos graxos poli-insaturados1.
Finalmente, a quarta geração de emulsões lipídicas surge no começo dos anos 2000 e traz o óleo de peixe em sua composição1. A principal característica desse item é sua grande quantidade de ômega-3, sobretudo em comparação ao ômega-6 e outros ácidos graxos de cadeia longa1.
E os demais componentes na formulação da emulsão lipídica?
Os ácidos graxos são os principais componentes das emulsões lipídicas. De forma bastante resumida, eles podem ser classificados conforme a presença da saturação ou não nas ligações de carbono, além do comprimento da cadeia desse elemento1.
É justamente a saturação dessas moléculas que determina a funcionalidade e utilidade de cada um dos ácidos graxos1. Por isso é tão importante conhecer a composição das fórmulas de nutrição parenteral e seus respectivos potenciais benefícios.
Além disso, de acordo com a necessidade para o organismo, os ácidos graxos podem ser classificados em essenciais e não essenciais. Dessa forma, os ácidos graxos poli-insaturados são considerados essenciais ao organismo (ou seja, precisam ser oferecidos por meio de fontes externas).
De todo modo, a composição das emulsões lipídicas contém outros elementos que também conferem à fórmula determinadas características funcionais. Os principais itens dessa categoria são:
- Fitoesteróis, que são pouco absorvidos, mas podem ser amplamente aproveitados na nutrição parenteral6. Apesar disso, o acúmulo no organismo pode suscitar o risco de quadros de colestase6,7.
- Alfa-tocoferol, a principal forma de vitamina E presente nas emulsões lipidicas1. A adição desse elemento é importante para prevenir a peroxidação de ácidos graxos poli-insaturados, contribuindo para estabilidade da fórmula8.
- Emulsificantes, na forma de fosfolipídios, que contribuem para permitir a dispersão de gotículas de gordura na fase aquosa da emulsão lipídica9. As principais fontes desse item são o óleo de soja e a gema de ovo1.
- Vitamina K, na forma de vitamina K1, que tem papel importante na coagulação sanguínea1. A recomendação de aporte desse item é de 1 μg/kg para adultos9,10. Entretanto, a concentração do elemento em cada emulsão lipídica varia, conforme a fórmula1.
Leia também: Quais as principais recomendações de segurança no uso de emulsões lipídicas injetáveis?
Como esses aspectos influenciam no custo-efetividade do uso emulsões lipídicas na nutrição parenteral?
A partir das diferentes composições das emulsões lipídicas, os especialistas avaliam de que forma cada alternativa pode contribuir para melhores desfechos em diferentes perfis de pacientes.
Com o tempo se descobriu, por exemplo, que a nutrição parenteral contendo ômega-3 está associada à diminuição no tempo de internação hospitalar em comparação com emulsões lipídicas sem o composto11. Desse modo, essa opção pode se revelar também mais custo-efetiva, como mostra um estudo de 202111.
Essa avaliação foi feita com base em dados de cinco países europeus e dos Estados Unidos. Para isso, os autores propuseram um modelo farmacoeconômico tendo como referência os benefícios do aporte de ômega-3 disponíveis em uma metanálise sobre o tema11.
Assim, foi possível comparar a probabilidade de desfechos negativos em pacientes hospitalizados e em estado grave utilizando as emulsões lipídicas com e sem ômega-3, fornecido principalmente pelo óleo de peixe11.
No fim, foi possível observar redução nos custos totais com cada paciente ao se optar por uma fórmula com ômega-3. A maior diminuição foi registrada nos Estados Unidos (média de € 5.576). Enquanto isso, na Itália, a economia girou em torno de € 1.741. Tais resultados se deram por conta da redução de gastos com as complicações infecciosas e menor tempo de permanência hospitalar11.
Assim sendo, a presença de ômega-3 nas emulsões lipídicas na nutrição parenteral não só contribuiu para melhores desfechos clínicos, como promoveu um uso mais racional dos recursos disponíveis, mesmo quando a comparação foi feita em diferentes sistemas de saúde10. Com isso, os autores sugerem que tal opção deva ser considerada como referência na abordagem de pacientes em uso de tal forma de suporte nutricional11.
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Referências:
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