O que é o ômega 3 e qual o seu papel nutricional?
A partir dos anos 2000, as emulsões lipídicas passaram a contar com a inclusão do óleo de peixe (OP), rico em ácidos graxos ômega 3 (1, 2). Nos últimos tempos, tal componente vem se tornando um item essencial nas fórmulas mais modernas, em contraposição àquelas desenvolvidas com óleo de soja, TCM e/ou óleo de oliva (2).
Mas afinal, o que é o ômega-3, quais são suas funções e qual é o seu papel da nutrição parenteral? É o que iremos descobrir hoje.
O que é ômega-3?
O ômega 3 (ω-3) é um grupo de ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa, fonte de energia e essenciais para nosso organismo.
Os principais tipos de ômega 3 são o ácido alfa-linolênico (ALA), o ácido eicosapentaenoico (EPA) e o ácido docosahexaenoico (DHA) (3).
O ALA é encontrado principalmente em óleos vegetais, como os de linhaça, soja e canola. Já o DHA e o EPA são encontrados em peixes e outros frutos do mar (3).
Na nutrição parenteral, o óleo de peixe é a fonte de ômega-3 para os pacientes hospitalizados, composto por uma longa cadeia condicionalmente essencial de ácido eicosapentaenoico (EPA, C20: 5 ω-3) e ácido docosahexaenoico (DHA, C22:6 ω-3) (2).
Qual o papel nutricional do ômega 3?
Os ácidos graxos da família ômega 3 são componentes importantes das membranas celulares. Além de fornecer energia, eles possuem diversas funções no coração, vasos sanguíneos, pulmões, sistema imunológico, sistema nervoso e sistema endócrino (3).
Seu papel nutricional, contudo, pode variar de acordo com a faixa etária e condição de saúde de cada indivíduo. Por exemplo, o suprimento adequado de PUFAs ω-3, especialmente DHA, tem papel fundamental no desenvolvimento visual, neural e comportamental em bebês (4).
Já EPA e DHA reduzem a produção de citocinas e substâncias pró-inflamatórias e, assim, favorecem a resposta imune normal. Isso pode ser benéfico em pacientes com comprometimento do sistema imunológico, como na sepse (5, 6).
De modo geral, o consumo adequado de ômega 3 já demonstrou diversos benefícios para a saúde de acordo com a literatura científica. Estes incluem (3):
- Prevenção e tratamento de doenças cardiovasculares
- Desenvolvimento infantil (exp: maior peso ao nascer)
- Prevenção do câncer
- Menor risco de deterioração cognitiva
- Menor risco de degeneração macular relacionada à idade (DMRI)
- Controle de artrite reumatoide
- Entre outros
Benefícios do ômega-3 na nutrição parenteral
Há um volume suficiente de evidências apontando para os benefícios do ômega 3 nas emulsões lipídicas que compõem a nutrição parenteral.
Uma revisão de 49 artigos de ensaios clínicos controlados e randomizados mostrou que fórmulas de nutrição parenteral enriquecidas com ômega-3 reduzem o risco de infecção (em 40%) e sepse (em 56%) quando comparadas às alternativas sem tal componente. Além disso, esses pacientes permaneciam até dois dias a menos em ambiente de terapia intensiva (7).
Outra revisão sistemática mais recente comparou resultados em quatro grupos de pacientes, conforme a composição da emulsão lipídica (2):
- Com óleo de peixe (como parte predominante da emulsão, mas poderiam conter outros óleos como soja, TCM e oliva)
- Com óleo de oliva e soja
- Com TCM e óleo de soja
- Com óleo de soja puro
Os autores descobriram que as ELs com óleo de peixe (dose média diária entre 0,1 e 0,2 g/kg) representaram a intervenção mais eficaz na melhoria dos resultados clínicos em pacientes adultos hospitalizados, dentre eles (2):
- Menor risco de infecção
- Menor risco de sepse
- Tempo de internação consideravelmente reduzido
- Mortalidade hospitalar reduzida
Segundo os pesquisadores, os resultados mostram que EL’s com óleo de peixe devem ser o padrão de tratamento, particularmente em situações associadas a um estado hipermetabólico e/ou hiperinflamatório, por exemplo, em doença crítica ou pós-cirurgia (2).
O que dizem as diretrizes?
Dado ao extenso corpo de evidências científicas, diversas sociedades de saúde recomendam o uso de ômega 3 na nutrição parenteral.
Estas incluem a Sociedade Europeia de Nutrição Clínica e Metabolismo (ESPEN) (8), a Organização Canadense de Nutrição em Cuidados Críticos (9) e Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (BRASPEN) (10).
Em geral, a dose recomendada é de 0,1 a 0,2 g/kg/dia de EPA e DHA (8, 10).
Segundos os especialistas da BRASPEN, a composição da EL deve depender do perfil metabólico de cada indivíduo:
- Pacientes hipermetabólicos: ELs contendo triglicerídeos de cadeia média (TCM), óleo de oliva ou óleo de peixe.
- Pacientes em estado crítico: ELs contendo apenas óleo de peixe, de modo a promover a melhor modulação da resposta imunológica.
Os autores também recomendam nutrição parenteral com ômega 3 para grupos de pacientes específicos, como câncer, cuidados perioperatórios, sepse, doença grave, entre outros (10).
O que podemos concluir?
Em suma, o uso de ômega 3 na nutrição parenteral tem sido amplamente estudado e recomendado devido aos benefícios clínicos observados, incluindo menor risco de infecções, redução do tempo de internação e melhor modulação da resposta imune.
Com base nas evidências científicas, diretrizes nacionais e internacionais reforçam a inclusão de emulsões lipídicas enriquecidas com ômega-3 como parte do suporte nutricional de pacientes hospitalizados, especialmente em condições críticas e inflamatórias.
De todo modo, qualquer abordagem deve ser proposta de forma personalizada, com o acompanhamento de uma equipe especializada capaz de identificar as necessidades e monitorar os resultados obtidos.
Referências:
1 – Calder PC, Adolph M, Deutz NE, et al. Lipids in the intensive care unit: recommendations from the ESPEN expert group. Clin Nutr 2018, 37(1): 1-18
2 – Pradelli L, Mayer K, Klek S, Rosenthal MD, Povero M, Heller AR, Muscaritoli M. Omega-3 fatty acids in parenteral nutrition – A systematic review with network meta-analysis on clinical outcomes. Clin Nutr. 2023 Apr;42(4):590-599.
3 – Omega-3 Fatty Acids. National Institute of Health. Office of Dietary Supplements. 2022.
4 – Calder PC. Very long-chain n-3 fatty acids and human health: fact, fiction and the future. Proc Nutr Soc. 2018 Feb;77(1):52-72.
5 – Calder PC. Marine omega-3 fatty acids and inflammatory processes: Effects, mechanisms and clinical relevance. Biochim Biophys Acta. 2015 Apr;1851(4):469-84.
6 – Calder PC, Ahluwalia N, Brouns F, Buetler T, Clement K, Cunningham K, Esposito K, Jönsson LS, Kolb H, Lansink M, Marcos A, Margioris A, Matusheski N, Nordmann H, O’Brien J, Pugliese G, Rizkalla S, Schalkwijk C, Tuomilehto J, Wärnberg J, Watzl B, Winklhofer-Roob BM. Dietary factors and low-grade inflammation in relation to overweight and obesity. Br J Nutr. 2011 Dec;106 Suppl 3:S5-78.
7 – Pradelli L, Mayer K, Klek S, Omar Alsaleh AJ, Clark RAC, Rosenthal MD, Heller AR, Muscaritoli M. ω-3 Fatty-Acid Enriched Parenteral Nutrition in Hospitalized Patients: Systematic Review With Meta-Analysis and Trial Sequential Analysis. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2020 Jan;44(1):44-57.
8 – Singer P, Berger MM, Blaser AR, Calder PC, et al. ESPEN guideline on clinical nutrition in the Intensive care. Clin Nutr 2018; 1-32.
9 – Heyland DK, Lee Z-Y, Lew CCH, Ortiz LA, Patel J, Stoppe C. Composition of parenteral nutrition: type of lipids. Crit Care Nutr Syst Rev. Critical Care Nutrition.com.
10 – Castro MG et al. Posicionamento BRASPEN sobre o uso clínico de ômega-3 via parenteral. BRASPEN Journal. 2022.

