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Por que avaliar os níveis de fosfato no paciente crítico?

Ainda que muitas vezes não apareça listado como micronutriente por conta da dosagem recomendada acima dos 100 mg, o fosfato (obtido a partir da combinação do fósforo e do oxigênio) é um eletrólito essencial no manejo nutricional de pacientes em diferentes condições1,2,3. Por isso, torna-se indispensável compreender como níveis adequados de fosfato podem contribuir para melhores desfechos.

Dessa forma, é possível não apenas agir para tratar eventuais deficiências, como também otimizar o monitoramento e a suplementação deste elemento, cujos impactos do déficit podem ser maiores do que se imagina.

 

Qual o papel do fosfato e quais os impactos da hipofosfatemia no organismo?

O fósforo desempenha papel importante em vários processos fisiológicos e metabólicos cruciais que contribuem para a homeostase do organismo1,2,4,5. Com isso, deficiências graves de fosfato (e de outros minerais) podem ter reflexos sobre a condição dos pacientes, inclusive elevando o risco de morte2,5.

A deficiência de fósforo recebe o nome de hipofosfatemia. Ela geralmente aparece em quadros de sepse, de abstinência de álcool, de desnutrição, de síndrome de realimentação, de alcalose metabólica ou respiratória e após trauma grave ou cirurgia1,2,3,6. Circunstâncias que provocam déficits de vitamina D e hiperparatireoidismo2,6 também podem causar tal problema.

Já entre as substâncias associadas aos quadros de hipofosfatemia em pacientes graves estão diuréticos, catecolaminas, insulina e glicose, além de procedimentos necessários para terapias de substituição da função renal4.

Assim, se seu paciente passa por algumas dessas situações ou está em uso de substâncias como as citadas, é importante que um plano de avaliação inicial e monitoramento constante seja traçado.

Além disso, vale destacar que, na maioria dos casos, os pacientes graves estão sob risco de deficiência de fosfato por conta da redução de ingestão alimentar associada à doença, aumento de perdas e da demanda de nutrientes ou ainda devido aos efeitos colaterais de alguns medicamentos1 (veja mais no mini-info).

Todavia, ainda que se reforce a importância da prevenção e tratamento das deficiências de micronutrientes e minerais (como é o caso do fosfato), nem sempre é claro de que forma é possível otimizar a mensuração dos níveis dessas substâncias, inclusive em pacientes gravemente doentes1.

 

 

Qual o impacto dos níveis de fosfato nos desfechos clínicos?

Em tal contexto, um estudo feito por pesquisadores brasileiros e publicado em 2023 tentou demonstrar como a mensuração dos níveis de fosfato em pacientes críticos poderia servir como ferramenta para traçar prognóstico.

Dados de 449 pacientes adultos admitidos em unidade de terapia intensiva (UTI) e que ficaram internados por, pelo menos, 24 horas, foram coletados. A maioria dos pacientes foi encaminhada para a UTI por conta de problemas cardíacos (42%) e gastrointestinais (16%)7.

Após a internação, os níveis de fosfato foram mensurados na primeira hora da admissão e posteriormente de forma diária. Com os dados das análises em mãos, os pacientes foram divididos em três grupos7:

  • Pacientes com níveis de fosfato normais;
  • Pacientes que tinham, pelo menos, um valor de fosfato abaixo de 0,74 mmol/L e nenhum acima de 1,5 mmol/L, caracterizando a hipofosfatemia;
  • Aqueles com patamares acima de 1,5 mmol/L, que sugerem um quadro de hiperfosfatemia. Esse último grupo foi excluído do estudo.

Quando necessário, o fosfato foi resposto conforme os protocolos da instituição. Em suma, foi possível constatar que 111 pacientes, dentre os 317 elegíveis para o estudo, possuíam algum grau de hipofosfatemia7.

Na prática, esses indivíduos tinham piores escores em ferramentas como o APACHE II (que mede a gravidade dos pacientes em UTI) e o SOFA (que monitora a progressão na disfunção dos órgãos)8. Além disso, a mortalidade hospitalar e na unidade de terapia intensiva também foram maiores nesse grupo7.

Assim, os autores reforçam como níveis de fosfato abaixo do ideal podem ser um indicador importante para a evolução e para piores prognósticos, reafirmando a importância do monitoramento adequado7. Além disso, destacam que a suplementação endovenosa de fosfato foi segura e eficiente para esses pacientes de UTI7.

 

Veja também: Hipofosfatemia e nutrição parenteral: o que é essa possível complicação e como evitar?

 

Qual o perfil de acompanhamento dos níveis de fosfato em pacientes na UTI?

Otimizar a administração e o monitoramento do nível de fosfato (e outros micronutrientes) é uma recomendação necessária nas práticas atuais no ambiente hospitalar.

Com isso em mente, outro grupo de pesquisadores preparou um questionário sobre o tema para interrogar profissionais de saúde sobre as abordagens adotadas. Ao todo, foram coletadas 334 respostas, em sua maioria (96%) de médicos1. Nutricionistas, enfermeiros e farmacêuticos clínicos também fizeram parte da amostra. Os autores da pesquisa observaram que1:

  • 24,3% dos respondentes afirmaram monitorar deficiências de micronutrientes por meio de avaliações de sinais clínicos e/ou medidas laboratoriais;
  • 44,3% dos profissionais disseram fazer monitoramento de rotina com exames de sangue;
  • 87,4% dos entrevistados disponibilizaram dados sobre o uso de micronutrientes na nutrição parenteral. Desse montante, 51,4% utilizavam combinações de multivitamínicos e oligoelementos em pacientes selecionados;
  • Entre as vitaminas e minerais mais oferecidos estão a tiamina (50,0%), outras vitaminas do complexo B (35,6%), o ácido fólico (29,5%) e ferro (23,3%);
  • 35,9% dos participantes da pesquisa afirmaram monitorar regularmente o fosfato;
  • 59,2% suplementaram o fosfato na nutrição parenteral de forma rotineira.

No fim, os responsáveis pelo estudo reforçam que essas diferenças no monitoramento dos níveis de fosfato e outros micronutrientes pode tornar mais difícil identificar quadros de deficiência em pacientes críticos1. Dessa forma, os números apresentados devem servir de base para futuras comparações e desenhos de protocolos baseados em evidências científicas para a prática clínica de monitoramento e reposição de micronutrientes nesse grupo de pacientes1.

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Referências:

  1. Vankrunkelsven W, Gunst J, Amrein K, Bear DE, Berger MM, Christopher KB, et al. Monitoring and parenteral administration of micronutrients, phosphate and magnesium in critically ill patients: the VITA-TRACE survey. Clin Nutr. 2021;40(2):590-599. Disponível em: <https://www.clinicalnutritionjournal.com/article/S0261-5614(20)30295-8/fulltext> Acesso em 10 de abril de 2024.
  2. Dietary reference values for nutrients: summary report. EFSA supporting publication. 2017. Disponível em: <https://www.efsa.europa.eu/en/supporting/pub/e15121> Acesso em 10 de abril de 2024.
  3. Koekkoek WAC, Van Zanten ARH. Is refeeding syndrome relevant for critically ill patients? Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2018;21(2):130-137. Disponível em: <https://journals.lww.com/co-clinicalnutrition/abstract/2018/03000/is_refeeding_syndrome_relevant_for_critically_ill.12.aspx> Acesso em 12 de março de 2024.
  4. Sin JCK, King L, Ballard E, Llewellyn S, Laupland KB, Tabah A. Hypophosphatemia and outcomes in ICU: a systematic review and Meta-analysis. J Intensive Care Med. 2021;36(9):1025-1035. Disponível em: <https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0885066620940274?url_ver=Z39.88-2003&rfr_id=ori:rid:crossref.org&rfr_dat=cr_pub%20%200pubmed> Acesso em 12 de março de 2024
  5. Casaer MP, Bellomo R. Micronutrient deficiency in critical illness: an invisible foe? Intensive Care Med. 2019 Aug;45(8):1136-1139. Disponível em: <https://link.springer.com/article/10.1007/s00134-019-05678-y> Acesso em 10 de abril de 2024.
  6. Broman M, Wilsson AMJ, Hansson F, Klarin B. Analysis of hypo- and hyperphosphatemia in an intensive care unit cohort. Anesth Analg. 2017;124(6):1897-1905. Disponível em: <https://journals.lww.com/anesthesia-analgesia/fulltext/2017/06000/analysis_of_hypo__and_hyperphosphatemia_in_an.26.aspx> Acesso em 10 de abril de 2024.
  7. Lima Jr W, Calderaro DC, Passos R, Côrte M, Leal JA, Mayrink MO, et al. Lower mean phosphate independently predicts mortality in critically ill patients: Results from a prospective cohort study. J Crit Care. 2023;75:154273 Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0883944123000229?via%3Dihub> Acesso em 12 de março de 2024.

 

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