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Afinal, as calorias não nutricionais devem ser contabilizadas? 

Calorias não nutricionais são aquelas provenientes de fontes alternativas à nutrição parenteral ou enteral. Muitas emulsões intravenosas e alguns medicamentos fornecem algumas dessas calorias.

No entanto, por mais insignificantes que pareçam do ponto de vista energético, a contabilização dessas calorias deve seguir alguns parâmetros, principalmente para não trazer consequências negativas à progressão do paciente. Logo, acompanhe nos tópicos abaixo o que precisa ser observado.

 

A contabilização das calorias não nutricionais

Sim, as calorias não nutricionais devem ser contabilizadas. Sem isso, o paciente corre o risco de sofrer o chamado overfeeding, termo que se refere ao excesso de oferta energética. A literatura atual considera que há overfeeding quando a ingestão de calorias ultrapassa os 110% da demanda energética calculada1.

Na prática, todas as calorias não nutricionais devem ser não apenas contabilizadas, como descontadas da necessidade calórica estabelecida. Além disso, é essencial revisar a oferta proteica para garantir que não haja um déficit nesse aspecto. Isso acontece porque muitas fontes de calorias não nutricionais fornecem apenas essas calorias, e não proteínas.

 

As principais fontes de calorias não nutricionais

Entre as fontes mais comuns de calorias não nutricionais estão o soro glicosado, o citrato (usado na hemodiálise contínua) e o propofol. Elas são algumas das substâncias que contribuem para a oferta de calorias e que, frequentemente, são negligenciadas na dose total das necessidades nutricionais.

Como exemplo, cada ml de propofol possui aproximadamente 1,1 kcal1 e 0,1 g de lipídio. Desse modo, um paciente recebendo 20 ml/h de propofol, ao final de 24 horas terá recebido 528 kcal e 48 g de lipídio à base de óleo de soja6.

Diante disso, deve haver sempre uma atenção especial com pacientes sedados utilizando propofol, com alto aporte de glicose endovenosa e em hemofiltração com citrato, visto a possibilidade do overfeeding proveniente dessas fontes calóricas não nutricionais3.

 

Leia também: Nutrição parenteral em adultos: Quais são as recomendações de nutrientes?

 

As consequências do overfeeding

O cuidado relacionado ao overfeeding é justificado diante das várias complicações que ele pode causar ao paciente.

Entre as mais frequentes estão a hiperglicemia devido ao aumento da resistência à insulina, esteatose hepática e até mesmo incremento na taxa de mortalidade. Além disso, alguns dados apontam que pacientes com overfeeding podem permanecer mais tempo em unidades de terapia intensiva4,5.

Por isso, justamente para dimensionar a relevância das calorias não nutricionais na nutrição de pacientes críticos, Bousie e colaboradores (2016)6 conduziram uma análise retrospectiva entre os admitidos numa unidade de terapia intensiva.

No estudo, foram incluídos pacientes que estavam recebendo nutrição enteral com ou sem nutrição parenteral. Ao final, foram avaliadas as proporções de calorias não nutricionais provenientes de determinadas fontes (propofol, citrato de sódio e glicose) nos sete primeiros dias de internação.

Ao todo, o estudo envolveu 146 pacientes. Desses, apenas em quatro não havia sido relatada ingestão de calorias não nutricionais. Nos outros 142, a mediana de calorias não nutricionais dentro da amplitude interquartil (ou seja, dentro do “centro da amostra”) foi de 580 kcal, com um intervalo entre 310 e 1043 kcal, em 7 dias.

Os pesquisadores também concluíram que nos primeiros dias de internação, a proporção de calorias não nutricionais sobre o total da dieta foi maior, provavelmente por coincidir com a fase inicial da nutrição. Nesse estágio, elas representaram, em média, entre 30,7% e 36,1% das calorias ingeridas.

A partir do quarto dia de internação, essa proporção se estabilizou em 6% no grupo de pacientes que recebia glicose ou propofol. Já quem recebia citrato de sódio, tal contribuição das calorias não calóricas se manteve mais estável, em 18% ao longo dos sete primeiros dias de internação.

Ou seja, em determinadas circunstâncias, as calorias não nutricionais podem representar até um terço das necessidades energéticas do paciente. Tal condição exige que esse parâmetro seja acompanhado de perto, sob risco das consequências do overfeeding, como mencionamos anteriormente neste artigo.

 

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