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Exemplos de complicações em quadros de síndrome do intestino curto

A síndrome do intestino curto (ou apenas SIC) é uma condição complexa associada a problemas de má absorção que ocorrem como consequência de uma redução anatômica ou funcional em trechos do intestino1.

Por conta dos desequilíbrios fisiológicos provenientes de um quadro de SIC, os pacientes podem apresentar uma variedade de complicações clínicas. Assim sendo, ter conhecimento sobre tais aspectos a partir da literatura sobre o tema é fundamental na prevenção e no manejo dessas situações, garantindo a manutenção da qualidade de vida do indivíduo afetado.

Diarreia

A diarreia costuma ser a principal queixa em casos da síndrome do intestino curto. Sua natureza, de difícil controle e gravidade, pode trazer reflexos significativos para o bem-estar do paciente2.

Ela é resultado das múltiplas alterações fisiológicas que ocorrem por conta da redução do tamanho e da área de absorção intestinal.

Além disso, fatores relacionados à anatomia intestinal remanescente, ao aumento da motilidade e secreção gástricas e à aceleração do trânsito intestinal podem afetar a intensidade dos sintomas3.

Em geral, a abordagem de tal complicação é complexa. Portanto, ela depende de um manejo multifatorial que envolve tanto a prescrição de determinados medicamentos, quanto a importante orientação da necessidade de alterações na dieta, no regime de fluidos e na hidratação do paciente1.

Desequilíbrios de fluidos e eletrólitos

Diante da importância do intestino na regulação dos fluidos corporais, é possível que a ressecção de trecho do órgão leve a grandes alterações do balanço dos líquidos corporais, bem como de determinados eletrólitos1.

Como resultado, é esperado que esses pacientes estejam sujeitos a um risco maior de desenvolver disfunções como1:

  • Desidratação;
  • Fadiga crônica;
  • Alterações cognitivas;
  • Perda de peso;
  • Lesão renal crônica;
  • Urolitíase (cálculo renal).

Dessa forma, os profissionais responsáveis pelo cuidado de um paciente com SIC precisam atuar para garantir o manejo adequado das diversas condições apresentadas.

Mensurações e registros devem ser acompanhados com frequência, tanto em relação ao volume de líquidos ingeridos, quanto ao volume eliminado de urina e fezes, para determinar a necessidade de fluidos de um paciente com SIC1. Alterações na sede e no peso são outros indicadores importantes1.

Seja como for, é preciso observar o volume e tipo de fluidos de hidratação mais recomendados e compatíveis com o quadro. Grandes volumes de líquidos hipotônicos ou hipertônicos podem favorecer o aumento do volume eliminado e da intensidade da diarréia1.

Por isso, nesse cenário, é possível que muitos pacientes se beneficiem da utilização de soluções de reidratação oral específicas1.4.

Por fim, quadros de hiponatremia, hipocalemia e hipofosfatemia tendem também a ser comuns. Eventualmente, a deficiência de magnésio é outro aspecto que chama a atenção. Seu manejo não é simples e pode se refletir na função de diversos sistemas do organismo1.

E assim, em muitas condições, para garantir o manejo de sintomas e manutenção do estado nutricional, pode ser necessária a suplementação de nutrientes e fluidos, inclusive por via parenteral1.

Deficiências de vitaminas e elementos-traço

É esperado que a remoção de determinado trecho do intestino interfira na forma como o organismo aproveita vitaminas, eletrólitos e elementos-traço. Tal fenômeno pode ser influenciado por fatores como:

  • Segmento intestinal remanescente;
  • Uso de determinados medicamentos;
  • Hábitos alimentares;
  • Uso da nutrição parenteral;
  • Condições inflamatórias no intestino, como a doença inflamatória intestinal.

Deficiências de vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) tendem a ser mais comuns1.4. Entre os minerais, o déficit costuma ser silencioso e envolve principalmente elementos como o zinco, o selênio, o cobre e o ferro1.

 

 

Por isso, o monitoramento da concentração dos níveis de vitaminas e elementos-traço é uma medida recomendada para pacientes com a SIC. A partir disso, é possível que esses indivíduos requeiram diferentes formas de suplementação para manutenção da concentração sérica adequada5.

Em alguns casos, a nutrição por via parenteral e o uso de suplementos específicos para atender as necessidades de oligoelementos podem ser prescritos por um profissional6.

 

Falência intestinal e doença hepática

Esse termo engloba uma série de anormalidades na função hepática, incluindo as colestases, as esteatoses e as cirroses1.

A evolução desses quadros costuma ser rápida em crianças e mais lenta em adultos7. E quando se fala em SIC, a ocorrência da disfunção hepática costuma estar entre as complicações do uso prolongado de NP ou Terapia de Nutrição Parenteral Domiciliar (TNPD)8

Isso faz com que, especialmente na TNPD, a suplementação de ácidos graxos essenciais se torne mandatória, sobretudo óleo de peixe. Ainda assim, há riscos de lesão hepática relacionados à taxa de infusão e quantidade de lipídio administrado9.

 

 

Referências

 

  1. Bering J, DiBaise JK. Short bowel syndrome: Complications and management. Nutr Clin Pract. 2023;38. Disponível em: <https://aspenjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1002/ncp.10978> Acesso em 24 de julho de 2024.
  2. Parrish CR, DiBaise JK. Managing the adult patient with short bowel syndrome. Gastroenterol Hepatol (N Y). 2017;13(10):600‐608. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5718176/> Acesso em 09 de agosto de 2024.
  3. Massironi S, Cavalcoli F, Rausa E, Invernizzi P, Braga M, Vecchi M. Understanding short bowel syndrome: current status and future perspectives. Dig Liver Dis. 2020;52(3):253‐261.Disponível em: <https://www.dldjournalonline.com/article/S1590-8658(19)30922-3/abstract> Acesso em 09 de agosto de 2024.
  4. Iyer K, DiBaise JK, Rubio‐Tapia A. AGA clinical practice update on management of short bowel syndrome: expert review. Clin Gastroenterol Hepatol. 2022;20(10):2185‐2194.e2. Disponível em: <https://www.cghjournal.org/article/S1542-3565(22)00561-4/fulltext> Acesso em 09 de agosto de 2024.
  5. Matarese LE. Nutrition and fluid optimization for patients with short bowel syndrome. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2013;37(2):161‐170. Disponível em: <https://aspenjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1177/0148607112469818> Acesso em 09 de agosto de 2024.
  6. Castro M, Ribeiro P, Zambelli C, et al. BRASPEN position on the use of micronutrients parenterally in adults. Braspen Journal. Disponível em: < https://braspenjournal.org/article/10.37111/braspenj.AE.2021.36.1.01/pdf/braspen-36-1-3.pdf > Acesso em 09 de agosto de 2024.
  7. Cavicchi M, Beau P, Crenn P, Degott C, Messing B. Prevalence of liver disease and contributing factors in patients receiving home parenteral nutrition for permanent intestinal failure. Ann Intern Med. 2000;132(7):525‐532. Disponível em: <https://www.acpjournals.org/doi/10.7326/0003-4819-132-7-200004040-00003?url_ver=Z39.88-2003&rfr_id=ori:rid:crossref.org&rfr_dat=cr_pub%20%200pubmed> Acesso em 09 de agosto de 2024.
  8. Mitra A, Ahn J. Liver disease in patients on total parenteral nutrition. Clin Liver Dis. 2017; 21(4): 687-95. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1089326117300569?via%3Dihub. Acesso em 11 de outubro de 2024.
  9. Hojsak I, Kolacek S. Fat overload syndrome after the rapid infusion of SMOFlipid emulsion. JPEN J Prenteral Enteral Nutr.2014;38(1):119-21. Disponível em: https://aspenjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1177/0148607113482001. Acesso em 24 de setembro de 2024.